O barco continua afundando

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Muitas são as razões que aceleram o pavio

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JOÃO CONRADO

Quando o cenário político-econômico já andava beirando o fundo do poço e ninguém mais imaginava que tudo poderia piorar, piorou. O pavio que vai até o barril de pólvora está queimando cada vez mais rápido e uma catástrofe pode ocorrer a qualquer momento, independente da ação de bombeiros do calibre do ex-presidente Michel Temer em tentar apagar esse bendito pavio.

Muitas são as razões que aceleram o pavio, às vezes originadas pela turma do presidente Bolsonaro, ele incluído, outras vezes pela turma que apoia o ex-presidente Lula, ele também incluído junto com a imprensa, a maior parte dos políticos e o alto escalão do Poder Judiciário, que se acha ameaçado pelas manifestações ditas antidemocráticas. A coisa arrefeceu após a entrada em campo de Temer, mas tudo indica que a calmaria não dura duas semanas.

Não resta dúvida que as declarações e ações de Bolsonaro acirram os ânimos ou, como diz a grande imprensa, esticam a corda. O presidente anima seu grupo a postar declarações que beiram ameaças de golpe, invocam uma intervenção militar e prometem substituir todo o Supremo Tribunal Federal. Tais ações são vistas como algo perigoso e que precisam ser estancadas, razão que leva a alimentar o fogo da CPI do Covid-19 e a instaurar outras CPI por crime de responsabilidade do presidente.

Tais ameaças não são novidades no cenário político brasileiro e foram praticadas à exaustão pelo ex-presidente Lula no seu mandato, sob vista grossa da imprensa e dos demais poderes instituídos. Quem não lembra do “STF acovardado”, falado em alto e bom som pelo Lula quando a avalanche de denúncias de corrupção recaía sobre ele e seus aliados? Quem esqueceu da ameaça de “chamar o exército do Stedile e incendiar este país”, proferido como ameaça de uma guerra civil caso Lula fosse preso? Somente uma amnésia coletiva poderia explicar a ação dos Black blocs, vandalizando órgãos públicos há pouco tempo ou as invasões dos Sem-terra destruindo plantações e pesquisas, matando animais e causando arruaças sem qualquer manifesto das autoridades para coibir esse tipo de coisa.

Outro fato que joga mais gasolina nessa fogueira são as recentes decisões judiciais extinguindo processos e isentando investigados, entre eles o próprio Lula, de responderem pelos seus pecados. Envia-se para a lata do lixo tudo aquilo que foi investigado, confessado, gerado acordos de leniência, julgado, condenado e referendado em instâncias superiores. É como se tudo o que foi exposto de nada valesse, apenas porque o fórum onde foram julgados não era competente, muito embora tenha sido confirmado nos colegiados superiores. Pode até ser que, na ótica do processo judicial, as recentes decisões possam ser explicadas, mas vai dizer isso para o povo que comemorava um possível fim da impunidade.

O grande problema dessa história toda é que o país não avança no combate às desigualdades, na mitigação da pobreza e na retomada do crescimento econômico. As reformas não saem do lugar e apoiá-las começa a ser tratado como moeda de troca entre políticos que só enxergam o toma-lá-dá-cá que impera desde que o Brasil é Brasil. Ninguém discorda da reforma administrativa, desde que extinga apenas os benefícios dos outros e mantenham os seus. Ninguém é contra a reforma tributária, mas não quer cortar despesas públicas, a começar pelos enormes e inexplicáveis gastos nos gabinetes das vossas excelências. Nenhum país sobrevive a isso, só o Brasil.

Muito acham que essas discussões polarizadas são apenas cortina de fumaça propositadamente criadas para desviar o foco das decisões mais importantes e deixar tudo como sempre foi. A ninguém que tenha abrigo nesse guarda-chuva de benesses interessa mudanças e, por isso, montam todo esse teatro que joga o chamado “gado” (apoiadores de Bolsonaro) contra os ‘burros” (apoiadores do Lula), meros coadjuvantes que sequer entendem o que se esconde atrás da neblina. Uma pena que seja assim, que tanta gente boa e inteligente esteja cega de paixões e opte por debater ofensivamente com seus adversários nas redes sociais. Enquanto isso, os verdadeiros beneficiados do “deixa como estar” comemoram o fracasso político e econômico não do governo Bolsonaro, mas do país. O povo que se exploda, diria Justo Veríssimo, o impagável personagem de Chico Anysio.

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