A função política da OAB

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Finalidade da Ordem vai muito além do controle do exercício da advocacia

SERGIO TAMER*

*Sérgio Tamer foi Conselheiro da OAB-MA e ex-presidente da Comissão de Direitos Humanos, na gestão dos presidentes Raimundo Marques e Caldas Góis. É atualmente presidente do Centro de Estudos Constitucionmais e de Gestão Pública – CECGP, e da SVT Faculdade de Ensino Superior.

Muitos assuntos que estão na ordem do dia, e que em qualquer outro país estariam afetos exclusivamente ao Congresso e à classe política em geral, no Brasil aparecem vinculados a uma organização pertencente à classe dos advogados. Pode parecer estranho para o leigo, mas tem a OAB uma função política muito importante conferida em lei.

A questão é saber como, quando e para quê utilizar essa função, além da precisa identificação dos seus contornos, o que, convenhamos, nem sempre tem sido fácil, aqui e alhures, o que bem realça o fato de que uma atribuição de tal envergadura merece sempre de sua Presidência – e do respectivo Conselho – um descortino político-institucional adequado.

O certo é que a finalidade da OAB vai muito além de suas prerrogativas no controle do exercício cotidiano da advocacia, a exemplo do que vem sendo feito com a devida presteza quanto à representação, defesa, seleção e disciplina dos advogados.  É que a Ordem dos Advogados do Brasil detém prerrogativas que lhes foram atribuídas inicialmente pela lei 4.215/63, do seu antigo Estatuto, que nenhuma congênere sua assumiu em qualquer outro país. Atualmente, as questões político-institucionais, além de figurarem como uma das duas finalidades gerais da OAB, consoante o art.44 da lei 8.906/94, estão cometidas expressamente ao Conselho Federal, ao Conselho Seccional e às Subseções. Desta maneira, a defesa da Constituição, a ordem jurídica do Estado democrático de direito, os direitos humanos, a justiça social, e o combate incansável na lide pela boa aplicação das leis, pela rápida administração da justiça e pelo aperfeiçoamento da cultura e das instituições jurídicas, são princípios inafastáveis para uma boa e correta gestão da Ordem.

Deve-se reconhecer que muito se deve a Seabra Fagundes a trajetória da entidade nesta direção de grandeza e civismo. A organização inicial da OAB, mediante o Regulamento de 1931-33, tomou como modelo o Burreau de Paris, destinando-se a ser o órgão de seleção e disciplina da classe, tão-somente. Paulo Lôbo lembra que com o correr do tempo, as vicissitudes institucionais por que o país foi passando (da reconstitucionalização em 1934 ao Estado Novo), tantas vezes com reflexo no exercício da atividade do advogado e mesmo no papel cívico imanente na sua condição profissional, fizeram que o Congresso, sob a inspiração do Conselho Federal, conferisse à OAB o estatus que hoje possui.

Temos exemplos históricos notáveis dessa atuação política da OAB, como as campanhas pela redemocratização do País, pelas eleições diretas, pela ética na política, pela probidade administrativa, pelo combate à corrupção, pelo controle externo do Judiciário e tantas outras bandeiras que têm sido desfraldadas com arrojo e destemor nessa direção. Essa admirável e aplaudida atuação da OAB só lhe é permitida, porém, quando em jogo interesses que transcendem as relações individuais ou quando a defesa dos interesses de grupos determinados de pessoas, excepcionalmente, convenham à toda coletividade.

A OAB, desta forma, adquiriu confiabilidade e prestígio porque não se cingiu exclusivamente às suas questões internas, embora não se tenha descurado da tarefa de valorização da advocacia e da seleção e disciplina dos advogados, a exemplo do Exame de Ordem, da sua Escola Superior de Advocacia, dos Congressos Jurídicos, da campanha permanente voltada para a ética na profissão e no combate à corrupção eleitoral, além do trabalho de suas Comissões.

Todavia, a função política da OAB não se confunde com a política partidária ou com a política governamental. Tanto o pluralismo político quanto o apartidarismo são imprescindíveis para sua sobrevivência e a OAB, sendo de todos os advogados, a sua força reside, como bem interpretou Paulo Lôbo, na “sabedoria em traduzir o pensamento médio da classe”.

É desafiadora, portanto, a ingente missão que aguarda pelas ponderadas ações do Conselho Seccional na seara de suas funções políticas, hoje  liderado pelo compromissado presidente Kaio Saraiva, com a certeza indubitável de que tanto este como aquele estarão à altura das esperanças em si depositadas, sobretudo pela jovem advocacia. Avante!

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