Em que consiste o trabalho de auditoria?

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Escândalos ocorrem em todas as latitudes

  • JOÃO CONRADO
  • conrado1959@gmail.com

Sempre que acontecem grandes escândalos financeiros, como agora acontece com a Americanas, as pessoas perguntam por que os auditores não foram capazes de perceber as fraudes embutidas nos balanços e demais demonstrações contábeis divulgadas pelas empresas envolvidas. Não deixa de ser uma questão interessante, dado que esses relatórios contábeis têm o objetivo de comunicar ao mercado a situação econômico-financeira da entidade e, para maior garantia, são assegurados por firmas de auditoria de reconhecida reputação.

Foi assim no escândalo do mensalão, petrolão, lava-jato e todos aqueles que abalaram a República há pouco tempo. Apenas para citar um exemplo, a Petrobrás, depois de descoberta a sua participação no desvio de recursos, reconheceu contabilmente os sobrepreços de ativos reduzindo o valor dos seus ativos. Não ficaram atrás a maior parte das empresas privadas também envolvidas no rosário de falcatruas, entre elas grandes construtoras, frigoríficos e um sem-número de companhias envolvidas até o gogó com as fraudes.

Escândalos de grandes proporções ocorrem em todas as latitudes, quase sempre com a mesma técnica de embromação, ou seja, relatórios contábeis fraudulentos, auditorias incapazes de perceber as anormalidades e milhares de acionistas, investidores e pobres-coitados que apostaram seus recursos nessas companhias por meio de fundos de pensão, prejudicados. Já assistimos esse filme no caso Enron e na crise do Subprime, nos Estados Unidos, e na Europa, na Ásia e até mesmo no Vaticano. Nem os santos são perdoados.

Voltando à questão que é o título deste artigo, o leitor e os investidores desavisados querem saber para que serve mesmo a auditoria se, vez por outra, são surpreendidos com falcatruas dessa natureza. A resposta não é tão simples, quanto parece, mas é possível discutir a questão. Para início de conversa, os auditores não são responsáveis pela emissão dos relatórios contábeis, mas sim os administradores das empresas junto com os contadores. Se esse pessoal está mal-intencionado na preparação de tais relatórios é quase certo que são tomados todos os cuidados para que as fraudes sejam encobertas. Não existe crime perfeito, é verdade, e as práticas indevidas mais cedo ou mais tarde serão descobertas, mas, até lá, muito estrago foi produzido.

Um segundo ponto a ser discutido é que os controladores nem sempre estão à frente dos negócios. A gestão está a cargo de um agente, recrutado no mercado e, teoricamente, pago para fazer valer os interesses dos acionistas. Ocorre que esse pessoal nem sempre está em sinergia com o interesse dos donos do capital, posto que são remunerados por desempenho e a apresentação de resultados nos balanços acaba por virar uma obsessão que pode levar a classificar contas de forma incorreta, dificultando a auditoria. Foi assim com a Enron (despesas foram evidenciadas como ativos), está sendo assim no caso da Americanas (dívidas foram classificadas incorretamente).

Há, ainda, o fato de que as auditorias são feitas por meio de seleção de eventos a serem averiguados, levando em conta critérios de risco. Nenhum auditor analisa a totalidade das operações ou eventos que ocorrem em uma empresa, mas uma amostra deles e, por esse caminho, é possível que algumas irregularidades não sejam percebidas. O relatório emitido pelo auditor destaca esse aspecto, informando se tratar de uma asseguração razoável de aquelas demonstrações contábeis estão livres de distorções relevantes.

Ainda que tudo isso possa parecer algum tipo de limitação ao trabalho dos auditores, é certo que os auditores possuem ferramentas que buscam minimizar as possibilidades de que algum erro ou fraude passe despercebido. São as técnicas de auditorias, que vão das entrevistas com as pessoas certas aos exames e testes que confirmam saldos, averiguam o registro de transações, observam a existência de itens, confirmam cálculos, avaliam documentos, refazem procedimentos, testam mecanismos de controle, enfim, buscam certificar a não ocorrência de distorções. A despeito de tudo isso, a qualidade do trabalho do auditor seria tanto maior quanto mais adequada fosse a evidenciação dos relatórios contábeis. É preciso investigar quem deu origem ao registro viciado e adotar mecanismos que possam coibir tal prática.

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