Melhoras não são abrangentes e que há riscos no contexto
Após anos de turbulências, a Venezuela tem dado sinais de recuperação econômica com a inflação sob controle e previsão de crescimento do PIB. A Sputnik Brasil ouviu especialistas para discutir os limites dessa recuperação e os impactos desse cenário em um momento de profundas mudanças políticas na região e no mundo.
Depois de anos como símbolo de problemas econômicos na região, a Venezuela superou o ciclo de hiperinflação e dá sinais de recuperação. Conforme os
dados mais recentes do Banco Central da Venezuela, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) — o indicador inflacionário do país — foi de 6,5% em maio. Em março, o índice chegou a 1,4%, o menor valor em dez anos.
Essa é a primeira vez, desde junho de 2015, que o INPC venezuelano está há mais de seis meses abaixo de 10%. O patamar, mantido desde setembro do ano passado, é muito distante dos altos números anteriores, que chegaram ao pico de 196,6% em janeiro de 2019.
A inflação não é o único dado econômico positivo do país. Segundo o
painel do Fundo Monetário Internacional (FMI), o PIB da Venezuela deve voltar a crescer em 2022. A previsão da instituição é que o crescimento seja de 1,5% neste ano — o primeiro aumento desde 2013.
Benefícios – Em meio à atual crise internacional, a Venezuela tem se beneficiado do aumento dos preços do petróleo e passou a ser
cortejada tanto pelos Estados Unidos — que busca ampliar a oferta de energia devido às sanções contra Moscou —, quanto por Rússia e China, com quem já tinha laços estreitos.
Em recente encontro com o chanceler russo, Sergei Lavrov, o chefe da diplomacia venezuelana, Carlos Faría, prometeu integração de Caracas aos sistemas financeiros russo (SPFS) e chinês (CIPS) para driblar as sanções dos EUA e seus aliados.
A Sputnik Brasil conversou com dois especialistas da área de relações internacionais para
discutir os efeitos políticos da melhora do cenário econômico na Venezuela na região e no mundo.
“Nós temos na Venezuela um ‘player’ com o qual os países da região terão que lidar, sejam esses países democráticos ou não, de esquerda ou de direita. Então, temos que voltar — para alguns a contragosto — a conversar com uma figura como o [presidente venezuelano, Nicolás] Maduro”, afirma em entrevista à Sputnik Brasil.
Para Vieira, a melhora econômica na Venezuela
impulsiona suas relações na região por uma questão “pragmática”. Segundo ele, mesmo com diferenças políticas, as prioridades regionais são atualmente menos ideológicas e mais econômicas.
“[A Venezuela] é um mercado consumidor importante e é um mercado fornecedor importante. Não pode ser ignorado em um contexto de crise em que as cadeias globais de valor estão se desarranjando e se reorganizado ao nível regional”, aponta Vieira.
“A discussão sobre o processo eleitoral na Venezuela pode ser ainda um ponto de distanciamento. De todo modo, há um ambiente político e geopolítico diferente que faz com que as discussões sobre a Venezuela entrem em uma nova fase”, afirma Holzhacker.
Ambos os pesquisadores também destacam que a reaproximação da Venezuela com os países da região
seria reforçada em um eventual retorno do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao governo. Apesar do potencial desse movimento de impactar o cenário político doméstico brasileiro, o histórico de governos petistas anteriores aponta para um papel de mediação do Brasil em relação à Venezuela no cenário global.
Na visão do professor Vinícius Vieira, a Venezuela tem “jogado muito bem” ao manter bons laços com Rússia e China e
ensaiar uma reaproximação com os EUA. Para ele, isso afasta maiores riscos de conflitos entre essas potências pela influência no país e na região.
“O risco haveria se a Venezuela fosse muito para o lado de Rússia e China e esses países se valessem disso para construir bases militares. […] Os EUA se reaproximando e mantendo um fluxo econômico reduz muito as chances de conflito, o que é benéfico para os países vizinhos”, conclui Vieira.